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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Gravidez


Era uma manhã de quinta-feira ainda cedo, céu meio nublado, ar fresquinho remanescente e sol querendo vir, quando a Vida veio sussurrar de modo súbito: escolhe! Me pegou de susto. Talvez o maior susto que já tive — se não, o mais contundente! Escolhe. Saí de lá horas depois com aquela sensação totalmente inédita, 100% uma desconhecida. Dois caminhos: escolhe. E escolhe já, agora! Os som dos ponteiros passou a um volume ensurdecedor, assim, de uma hora para outra. Tempo. Tempo passando, escolhe! Retumbava durante a minha volta para casa, aquela voz se repetindo seca, implacável: a escolha é sua, Sra.
Precisava optar por um ou outro caminho e era o quanto antes, imediatamente, para ontem! Mas precisava de tempo para pensar e não havia mais tempo algum a perder. Porém precisava de alguns dias, caçar algumas certezas, encontrar algum link que direcionasse a escolha. E aquela voz repetia no contratempo dos ponteiros: escolhe! A vida veio e me deu um ultimato. Me pôs contra a parede. Esfregou minha cara lavada contra minhas convicções.
A primeira coisa pensada no dia seguinte, foi o ensinamento de E.R: reconhecer suas fraquezas como ponto de partida para acessar suas fortalezas. E como me pesou sobre o peito compreender a isso de modo tão profundo agora. Sim, era um primeiro sinal de direção. Só que ainda não sabia o que queria. De um lado, o conforto da saída, da desistência, sedutoramente me convidado a deixar tudo para trás e ir abrindo caminho de nuvem...; sem mais esperas infinitas, sem mais negativas, recusas, abandonos, perdas, medos, dores. Do outro lado, o Novo sobre o qual nada nunca se sabe. A possibilidade da virada, coisas talvez resultantes de um rumo inesperado. Não só acessar, mas possuir a Fortaleza, a força de vontade, a auto-superação. Mas o que queria? Escolhe, repetia a voz dentro cada vez mais alta. Acho que preferia — falando sempre a verdade, o conforto da saída. Não queria perder a mais nada. Não queria abrir mão de mais, nem queria esperar, nunca mais. Tantas lutas, esperas que deram em nada. Por outro lado também não havia garantias de uma saída rápida — e isso sim, apavorava! Escolhe!!!, bradava a voz dentro, hora após hora, culpa após culpa a cada suspiro fosco, mais um. Olhava para trás e vinha lágrima seguida de lágrima seguida de outra ainda mais salgada, densa e honesta, sincera, legítima! Um Mar. Reconhecia ali todas as minha fraquezas sem enxergar ainda sequer menção de acesso às fortalezas. E me deitei com elas todas. Todas as minhas tristezas juntas numa só. E como eram corretas, como eram certeiras, como tinham ritmo na dança que faziam diante dos meus olhos. Velhas conhecidas recentemente ali compreendidas na íntegra, pelos danos que causaram — agora visíveis. Precisava disso, desse intervalo de tempo para a revolta, para a ira, para ir ter com Deus discussões singulares Lhe enchendo de desaforos justos. E o fiz. Joguei na cara Desafiadora de Deus todas a indignação de uma vez só, do primeiro dia até o último, lavando a Alma de uma vez por todas. Ainda durou um pouco mais essa sensação necessária buarquiana: o grito do homem voador ao cair em si (não por acaso, com Zizi). Foram dias assim, imersa no susto ainda. Na compaixão, na prática agora introjetada: sinto muito, me perdoa, te amo, sou grata. Sim, sinto muito. E aí veio a segunda ficha que precisava cair: o que eu não quero de jeito nenhum. E mais uma: e o compromisso com tudo que dizes tu, Necka, com a espiritualidade? E lembrei de novo de E.R: espiritualidade é o que busca o equilíbrio entre Alma, Mente e Corpo — tudo que for dito e que não respeite ao equilíbrio entre os 3, é falho. Outro baque! Outro estrondo dentro — a aí, Necka? Es-Co-Lhe! Já era o terceiro dia. Olhei para o futuro e soube o que eu não queria. E isso meio que definiu: o que não quero definindo o que teria de escolher. Algo que não queria, tendo de ser maior, infinitamente maior do que a soma de tudo que eu queria continuar tendo direito a ter. E para que o futuro não seja como eu não quero, precisaria dar adeus às coisas queridas mais caras que tive. Nisso me veio o Mestre Gil entoar uma das mais belas coisas compostas sobre a terra: se eu quiser falar com Deus tenho de comer o pão que o diabo amassou. É. Estava escolhido. E uma vez escolhido, hora das ações práticas. Mais dois dias se passaram entre firmeza e oscilação, serenidade e pranto. No sétimo dia veio uma elucidação inteira. A vida disse escolhe, 8 dias atrás. E somente hoje entendi o que isso significa. Que serei Mãe em breve: vou parir a nova existência, o novo rumo, o futuro inusitado, o todo da Força de Vontade, a nova cara, o novo cheiro, a nova voz. Honrar o compromisso, buscar o equilíbrio entre Alma, Mente e Corpo, acessar minhas fortalezas e seguir fazendo o que vim fazer. Espalhei bilhetes pela casa me lembrando do que eu não quero! E tenho tido alguns êxitos desde já. Ainda oscilo. Ainda é tentadora a outra escolha — e como! Mas preciso mesmo passar por esta experiência a ferro e fogo, para que depois a vitória seja toda minha, construída pelas minhas mãos que tanto erram, quanto perdoam.

Necka Ayala
11/10/2018

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