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quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Sobre o Amor

Tenho a te dizer, querida, que sobre o Amor, a coisa é muito diferente do que pensam as pessoas todas. O Amor não vem trazer prontos seus presentes lindos. Veio nos convidar a sermos Artesãos e usar da leveza das mãos para fazer nossos próprios presentes, tal como os imaginamos na pureza primeira que tínhamos na infância — feitos, brincaremos a quatro mãos. O Amor não vem entregar feitas as alegrias dele, mas nos chamar a vivenciar as nossas próprias alegrias, tal como as precisamos do nosso jeito de nos alegrar: para os enamorados bailarinos, na dança necessária; para os encantados poetas, no exercício da poesia, na extensão dela quando ela se traduz no encontro; para os amantes, no direito ao exercício dos arrepios das peles — causa-los e senti-los. O Amor não vem fazer milagres tecidos nos céus por obra do Pai numa hora escolhida a nossa revelia: ele vem para nos convidar a uma fé tão limpa e pura, que ela mesma trate de tecer e conceder nossos milagres, tal como precisemos que eles sejam na hora em que mais precisamos. Nem vem para nos dar caminho pronto, mas para nos dar dentro, nas pernas, a necessidade de desbravar nosso próprio caminho que, para uns, será uma estrada serra acima, rodeada de florestas e verdes muitos. Para outros será um asfalto longo que terminará numa cidade. O Amor não vem para injetar a cura se convertendo em remédio: vem para provar que a vida vivida e pulsante, oferece dentro dela a cura de cada um, numa poção mágica que nossa alquimia intui e fabrica. E nesse momento, o Amor apenas diz: se viveres, serás curado. Pois através do exercício de viver pelas vias do amor, o sangue se renova e volta a correr quente e livre pelos rios de nossas veias – e deixar que assim seja, é o que nos cura — profundamente. O Amor não vem para que nele depositemos as soluções de nossas vidas confusas e perdidas. Vem para ser a Beleza acima de nós que nos sustentará cada batalha e para beber conosco da taça da vitória quando concluirmos mais uma. E depois que bebemos com ele, o Amor, ele ensina: só terá confusão e perdição, aquele que negar ao próprio exercício e a própria expressão do Amor. Quando o Amor parte, quando deixamos que se vá de nós, o que perdemos? Primeiro, tudo entristece. Porque do nosso dia a dia, a Beleza se foi e o sangue esfriou nas noites sós. Depois vem a solidão e a falta, a saudade e a recordação salgada que nos inunda os olhos daquilo que não queremos — desviver. Mas o que perdemos de verdade e nem vemos, é a nós — não àquele que se vai de nós. Perdemos a nós, que ficamos privados de exercer nossa própria alegria, nossa própria comunhão, nosso próprio exercício de amar, nosso próprio aprendizado e tudo que dele viria em milagres e curas, bênçãos e redenção. De súbito paramos de ser Artesãos, Desbravadores, Magos, Poetas. Quando o Amor se vai de onde estava, não perdemos ao outro: perdemos a nós, que nos perdemos quando nos é negado o direito de evoluir, ir adiante, experimentar mais e deixar saírem de nós, as faces ainda adormecidas que despertariam para amar, uma por uma vida afora.  E dói, porque nos apartamos de quem somos: nós viemos do amor! Nós chegamos à luz através dele. Somos com ele e para ele desde que fomos concebidos: por isso ele é vital! Dói, porque de repente somos retirados do convívio com o amor. Dói, não só a ausência repentina do outro: o que dói mais, é o silêncio imenso de nossa voz que quisera prosseguir entoando as próprias melodias compostas pelo amor que era só nosso. E só havia um, aquele, naquele momento. O que nos fere a alma, não é ficar sem o outro ao lado: é ficarmos sem a nós mesmos, à nossa existência como ela vinha sendo enquanto duraram os tempos idos de comunhão. E só existe revolta, quando o Amor é ceifado por forças alheias a ele. Quando injusta, covarde e cruelmente, o que está fora dos domínios do Amor lhe tira a vida. E te digo: amaldiçoado será aquele que atentar contra a existência do amor. Pois tira dos outros o direito à vida dada, justamente, por ele.

Meu sonho mais sagrado, é encontrar quem queira, acima e antes de tudo, usar das forças que o amor mesmo nos concede, a fim de protege-lo! Pelo simples direito que cada um tem a confirmar a sua permanência ao lado do que sente. O Amor recompensa em graças e divindades, a quem se coloca feito Sentinela ao lado dele e o resguarda do mundo feio e frio, confia e espera. Só que, diferente do que pensas, não é ao outro que protegemos e defendemos quando queremos a continuidade do amor: é a nós mesmos e ao nosso próprio direito ao que nos cabe de Fe-li-ci-da-de. Esteja ela numa pequena bailarina, num artesão menino, num poeta amador ou num deus descido à terra para experimentar um pouco da linda loucura de ser humano.

Necka.

19/01/2017

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