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quinta-feira, 18 de maio de 2017

Chão

Permaneces olhando infinitamente para os pés, para os sapatos que calças, para as pedras no meio das avenidas, para os insetos que transitam, para a barra das calças. E a vida ali pedindo que olhes antes, para onde vais. O destino. O ponto aonde queres chegar. Permaneces preso ao que te prende, fitando a cor do metal que circunda teus pulsos, sentindo o frio dos elos em torno das tuas costas, fardos eternos que não tiras porque não vês que as chaves estão ali — perto, no lugar para onde não olhas. Permaneces inerte, inapto, não conseguindo, não conseguindo, não tendo, não sentindo, não sendo! Não podendo, não administrando, não querendo. E os dias passando, os anos virando as páginas dos calendários. E tu parado num tempo que não mais retorna, decorando o tamanho e o som repetitivo de tudo que começa com não. Um mantra às avessas que entoas em vez de decretares tua soltura. Não inicias a viagem. Não decolas tuas asas. Não sais desse lugar infernal ao qual tu mesmo te condenaste e a mim. Permaneces olhando ao mar no imaginário da beira. Não o tomas para ti, não entregas teu corpo inútil às ondas que poderiam te levar para longe, lá...longe, naquele lugar que dizes cada vez mais baixo que querias estar. Cada vez queres menos. Cada vez podes menos. Cada vez és menos. Nada tens. Não mais. Só porque permaneces olhando infinitamente para os pés, para os sapatos que calças, para as pedras no meio das avenidas, para os insetos que transitam, para a barra das calças . . .

Necka Ayala

19/05/2017

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