Sim,
tenho a boca adoçada, é verdade. Hoje sei. Foram os Magos, foram as Fadas,
foram os Deuses que me ofereceram suas taças cheias de poções. Eu? Eu aceitei.
E tive assim os lábios encantados e doces para sempre. Eu quis. Bebi. Sorvi
cada gole acreditando, acreditando, indo, mais adiante, com mais vontade a cada
vez, bebi sim! Eu aceitei. Era bom sentir na fina pele o fino cristal que vinha
trazer a próxima gota aveludada cor de vinho. Eu aceitei. Eu quis. Eu tive!
Tive a boca liberta, aberta, adoçada até agora e certa! De súbito aconteceu a
embriaguez leve, os olhos caindo um pouco, o corpo solto. A noite vinha, uma
primeira. Degraus, escada acima e, sem saber, subia para o infinito que me
esperava desnudo — eu? Eu fui. Eu quis. Eu tive. Nada me ocupava a mente — eu
nem tinha uma. E é bom não ter razão alguma, para que? Para que ela corte a
cara linda dos teus sonhos com fatos e argumentos? Para que? Eu? Eu não! Eu
sinto e sou. Eu posso e sou. Sim, tive o encantamento porque aceitei assim, ser
outra, uma única que atravessa os tempos de tempos em tempos e se refaz na
mesma feitiçaria: o toque de outra boca que aceita encantar-se no que sobrou
sobre meus lábios desde aquela vez. Sim, tenho a boca doce ainda. E dela não
sai palavra que minta, não sai passado que pese, não vem calar que não deixo!
Eu sinto muito, eu sei. E quem recebe o que sinto não pára de querer mais e
nunca tem que chegue se não souber ser também. E eu? Eu rio! Rio muito depois que
a porta bate. Rio da desgraça dos racionais, da solidão dos covardes, do amargo
gosto que fica nos lábios de quem não tem. Eu? Eu sou a divina presença sendo
toda eu.
Necka
Ayala
19/05/2017
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